Raiva com r maiúsculo

Qual você escolhe como um grande representante para a raiva?

Mônica (Mauricio de Sousa, 1963), Raiva (Disney, 2015) e Zangado (Disney, 1937)

Eu escolho a Mônica! Quando era criança existiam o Zangado e a Mônica, obviamente, e talvez por isso tenho uma conexão mais nostálgica com eles. O/A Raiva do DivertidaMente é mais das novas gerações, mas também tem o seu carisma. Em essência, esses personagens tão famosos apresentam em comum a emoção tão intensa da raiva. Eles tem pavio curto, sabe? Pouca paciência? Sim. Impulsividade? Também! Porém cada um tem as suas singularidades.

Olhando mais de perto para cada um

A Mônica nos mostra bem como é a raiva: uma reação diante de algo que incomodou, afetou ou passou dos limites. Geralmente, a personagem mobiliza toda a sua agressividade quando é chamada de dentuça e gorducha, por exemplo. Nem chorar ou se isolar, ela se defende com coelhadas.

A/O Raiva também se comporta de forma semelhante, trazendo reações explosivos e gritos irados. É visivelmente todo vermelho (e de cabeça quente, como se diz popularmente), com figurino mais “corporativo” e está sempre por um fio.

O Zangado também demonstra a raiva, sem a menor vontade de escondê-la. Ele tem um temperamento (ou personalidade) inflexível, que enxerga mais o lado ruim dos outros e das situações. Em algumas cenas, ele chega a expressar falas machistas (sim, eu sei que é uma animação de 1937). Outros grandes adjetivos para ele podem ser: rabugento e enraivecido. Percebo que existe algo além de uma reação momentânea/pontual perante uma situação transitória. Nesse sentido, ele é um contraponto interessante à Mônica que, ao contrário do Zangado, é uma personagem alegre e disposta a estar com os amigos. Zangado, por outro lado, passa uma energia de ressentimento, quase nada de paciência e quase nada de flexibilidade nas interações com os anões e com a Branca de Neve, sendo até mesmo desconfiado. Bom, mas assim como eu escrevi no texto da vergonha, o assunto personalidade/temperamento merece um post separado.

A raiva por ela mesma e como encará-la

Na Língua Portuguesa temos várias expressões populares: “na hora fiquei cego de raiva”, “o sangue subiu”, “cabeça quente”, “soltar fogo pelas ventas”, “enfezado”, “acordou de ovo virado”, entre muitas outras que não me recordo agora ou não conheço ainda. A raiva é uma das emoções que frequentemente faz parte da rotina das pessoas.

Sentir raiva tem a sua importância! Ela está entre os afetos básicos do psiquismo e é compartilhada com os demais animais. É uma reação perante àquilo que nos atravessou, incomodou, insultou, ameaçou ou quando nos deparamos com injustiças. A raiva tem o poder de mobilizar uma série de comportamentos de defesa, que muitas vezes estão relacionados à luta e hostilidade. Porém, devemos nos lembrar que estamos em sociedade e precisamos gerenciar como lidamos com a raiva e com os comportamentos derivados dela (Reich, 2022; Simanke, 2019).

Vou trazer um exemplo bem banal: dirigir, pegar trânsito e tudo mais. Isso é algo que fortemente convoca a raiva, não é difícil saírem xingamentos e buzinas durante um trajeto. Mas, é necessário inibir tudo isso, manter a calma e evitar comportamentos agressivos ou impulsivos. Umas das funções que se estabelecem com o desenvolvimento do lobo frontal do cérebro humano é o controle inibitório e a tomada de decisões. E essa região é a que demora mais para se desenvolver. Por isso que quando somos crianças e adolescentes prevalecem os comportamentos impulsivos, agressivos ou impensados. Essa é uma explicação das neurociências.

Para a psicanálise, raiva e irritação são representantes da pulsão de morte (que está no inconsciente) e são manifestações frente a um aborrecimento, frustação ou injustiça. Da raiva podem derivar sentimentos como o ódio (que é um extremo de destrutividade, que pode ter como destino outras pessoas ou a si mesmo) e a inveja (Simanke, 2019).

Não é incomum que a raiva e a irritação se combinem a partir de um quadro de estresse, especialmente em cidades grandes. Ai precisamos ter mais atenção ainda, pois sentir tudo isso constantemente exige muito do emocional e do físico de uma pessoa. Ao longo do tempo, há consequências para a saúde mental e física (Cabral, 2007).

Existem nuances

Admitir que sentiu raiva de algo ou de alguém pode ser um desafio para algumas pessoas, que chegam a segurar ao máximo antes de extravasar essa emoção tão forte. Também é importante dizer que podemos aprender a lidar de maneira mais saudável com a raiva, assim como com os demais afetos. A raiva tem uma relação estreita com a cultura e as situações sociais.

Referências

CABRAL, A. C. DE Q.. Stress e o turbilhão da raiva. Estudos de Psicologia (Campinas), v. 24, n. 1, p. 125–127, jan. 2007. Disponível em <https://www.scielo.br/j/estpsi/a/ZTk3sdx7XfnKLX75RnXQ3wp/?format=html&lang=pt>. Acessos em  27  out.  2025.

RECH, Dyane Lombardi et al . Técnicas para Manejo da Emoção de Raiva: Uma Revisão Sistemática. Estud. pesqui. psicol.,  Rio de Janeiro ,  v. 22, n. 1, p. 292-307,  jan.  2022. Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-42812022000100292&lng=pt&nrm=iso>. Acessos em  27  out.  2025.

SIMANKE, Richard Theisen. Além do bem e do mal: algumas considerações sobre a visão psicanalítica do ódio. Rev. bras. psicanál,  São Paulo ,  v. 53, n. 1, p. 125-148,  mar.  2019.  Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0486-641X2019000100010&lng=pt&nrm=iso>. acessos em  28  out.  2025.

Esse artigo foi escrito por:

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Jacqueline Bonardi Tavares

Psicóloga – CRP 06/201399

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